APETRO - Energia em evolução

Se não visualizar correctamente este email, clique aqui »

O papel das infraestruturas de gás na transição do setor energético

O setor da energia encontra-se em profunda alteração de paradigma, resultante de políticas energéticas com forte impacto em toda a cadeia de valor, exigindo progressivamente da sociedade uma operacionalização mais efetiva dos desígnios globais de descarbonização, com especial expressão nesta última década, sendo que Portugal tem vindo de forma sustentada a reduzir as suas emissões de gases de efeito de estufa desde 2005. Não obstante, o contexto energético atual apresenta enormes desafios para a nossa sociedade: Portugal depende fortemente de importação de energia – cerca de 75% – e a sua economia depende ainda bastante de fontes energéticas com elevado teor em carbono – cerca de 80% do consumo de energia primária. O paradigma energético e económico constitui aspetos centrais para o alcançar dos desígnios do Acordo de Paris, que foi sufragado pelo Estado Português em 2015 com vista à redução das emissões de gases com efeito de estufa (GEE) numa perspetiva de mitigar o efeito das alterações climáticas. Tal determina para a sociedade uma rota de descarbonização com uma forte aposta na eletrificação da economia, bem como o reforço dos princípios da economia circular e da eficiência energética, com objetivos nacionais que implicam a transformação destes desafios em soluções tecnológicas para uma economia de baixo carbono, custo-eficaz e com excelência.

As atuais políticas públicas rumo à neutralidade carbónica, nomeadamente o Roteiro Nacional para Neutralidade Carbónica 2050 e o Plano Nacional Energia e Clima 2030, visam dar resposta a tendências internacionais de descarbonização da economia, explorando uma matriz energética cada vez mais complexa, resultante de um mix de fontes renováveis de intermitência expressiva (solar, eólica e hídrica), que sustentarão a redução das emissões de gases de efeito de estufa da nossa sociedade. Não obstante, a garantia da segurança do abastecimento e a sustentabilidade financeira do sistema energético são fatores cruciais para o sucesso destes desígnios públicos deste setor crítico para a competitividade da economia.

Num sistema elétrico de base renovável, as políticas públicas estão a promover a utilização de eletricidade nos diversos setores de atividade económica, nomeadamente na indústria, nos transportes e nos setores residenciais e de serviços. Neste contexto, a descarbonização da economia será alcançada com recurso a gases de origem renovável, de forma complementar à eletricidade, pela promoção do uso de hidrogénio, garantindo a descarbonização do setor de gás natural, constituindo-se desta forma como um dos principais vetores da transição energética.

No setor elétrico, os desafios do investimento consistem em garantir a adequação do sistema electroprodutor à evolução da procura, gerindo simultaneamente a produção de origem renovável e a procura, recorrendo a ferramentas de gestão avançadas, para apoiar a gestão da rede com aquisição remota de dados e sistemas de controlo, otimizando a gestão global do sistema. No setor do gás, a transformação ainda reside na necessidade de descarbonizar a fonte de energia primária, garantindo a adequada compatibilidade dos ativos de transporte e distribuição, bem como a compatibilidade dos equipamentos de consumo, digitalizando os ativos da rede, de forma a assegurar a eficiência do planeamento e gestão de sistema.

Num racional de sinergia e otimização de recursos nacionais, o sistema energético necessita de investimentos significativos na capacidade de integração dos setores elétrico e de gás, numa perspetiva de assegurar que, num cenário de curto prazo, em que a variabilidade das fontes renováveis de eletricidade suprem o consumo, exista capacidade de armazenamento de energia, convertendo o excesso de eletricidade em hidrogénio de origem renovável. Será essencial a sua integração na rede de gás ou armazenamento nos sistemas subterrâneos, de forma a permitir a utilização de hidrogénio como combustível de centrais térmicas e assegurem potência firme ao sistema elétrico, no âmbito do conceito denominado Power-to-Power (P2P).

A estratégia de descarbonização da economia implicará também a necessidade de investimentos em infraestruturas de transporte e distribuição de energia, a fim de acomodar as distintas fontes de origem renovável e o crescimento esperado de consumo. Mercados complexos, ávidos por informação em tempo real aos agentes, criam desafios adicionais aos operadores de rede que ainda devem garantir a qualidade do serviço com tarifas de rede sustentáveis, quer no setor elétrico, quer no setor do gás. Neste contexto, releva-se a necessidade de desenvolvimento de regulamentação transitória por forma a fomentar o aumento da digitalização das infraestruturas de gás, fomentando investimentos em infraestruturas enquanto resposta à promoção das estratégias de descarbonização.

Os reguladores de energia têm vindo a desenvolver estratégias de integração dos mecanismos de regulação entre gás e eletricidade, nomeadamente no âmbito da qualidade de serviço e nas relações comerciais, contudo, será necessário partilhar estratégias de regulação entre setores de maturidade distinta, por forma a promover serviços energéticos mais eficientes no sentido de uma sociedade neutra em carbono, garantindo a sustentabilidade financeira do sistema de energia para todos os consumidores.

Num paradigma disruptivo de futuro não muito longínquo, em que os ativos de transporte e distribuição de energia desempenham papéis distintos dos atuais e onde a sustentabilidade dos modelos de remuneração não esteja garantida, releva-se necessário promover um planeamento regulatório de longo prazo dos modelos de regulação dos operadores: A transição energética pode provocar um desequilíbrio económico-financeiro dos próprios contratos de concessão em agentes de mercado fundamentais no processo.

A definição de tecnologias de integração de setores, para garantir a neutralidade carbónica da economia, surge em simultâneo com a necessidade de garantir a sustentabilidade destes modelos de negócio mais clássicos, altamente regulados e de empresas de capital intensivo.

Na promoção de uma transição energética sustentável será essencial a definição estruturada de políticas públicas para desenvolvimento dos modelos de regulação dos setores elétrico e gás, necessariamente integrados para responder às metas de descarbonização da economia e, em que a tecnologia adotada impacta claramente na viabilidade económica das soluções.

Bruno Henrique Santos, Membro do Board Future Energy Leaders – Portugal, PhD candidate na Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto em Engenharia e Política Pública

João Abel Peças Lopes, Professor Catedrático na Faculdade de Engenharia, Universidade do Porto. Diretor Associado do INESC TEC, IEEE Fellow

Nota. Com esta nova rubrica de artigos de opinião, a Apetro pretende envolver os especialistas, a academia, os opinion leaders e os profissionais do setor, na divulgação de temas atuais e de relevância para a indústria. Caso tenha interesse em partilhar o seu artigo de opinião por favor, entre em contacto connosco através de apetro@apetro.pt. Relembramos ainda que os textos publicados são responsabilidade dos seus autores.

Se desejar deixar de receber esta newsletter clique aqui»

Apetro - Energia em evolução

Av. Engº Duarte Pacheco | Amoreiras
Torre 2 , 6º piso , Sala 1 | 1070 - 102 LISBOA
T: 21 384 40 65
apetro@apetro.pt